A verdade e as formas jurídicas, de Michel Foucault

Michel Foucault é um nome muito conhecido nos cursos superiores de Direito e Sociologia. Foi recentemente citado no filme Tropa de Elite em uma cena de debate acadêmico. Foucault é conhecido porque é polêmico. Suas concepções sobre o poder, o saber e o sujeito vão de encontro a alguns dos maiores pensadores da humanidade. Foucault foi professor de História dos Sistemas de Pensamento em Paris até 1984, ano em que morreu em decorrência da AIDS.

O livro A verdade e as formas jurídicas traz o teor de cinco conferências proferidas por Foucault na PUC do Rio de Janeiro em 1973. Nessas conferências são antecipados os desenvolvimentos contidos no livro Vigiar e Punir (1975) e pode-se observar a demonstração do vínculo entre os sistemas de verdade. Pode-se dizer que é um livro originalmente em português de um escritor francês. O livro é dele, mas não foi escrito por ele.

Primeira conferência - Foucault utiliza-se de alguns textos de Nietzsche para difereciar o saber e o conhecimento. Segundo ele, origem difere de invenção. E tudo o que foi inventado pelo homem tem como objetivo alguma relação de poder. A dominação de uns sobre os outros. Estas invenções incluem o conhecimento, a religião, os ideais, etc. Aquilo que revelar mais nitidamente as relações de poder é o que tende a estar mais próximo da verdade. Segundo Foucault, as decisões jurídicas penais se encaixam nesta categoria, pois mostram o que uma sociedade considerava como certo e errado em determinada época.

Segunda conferência - O mito de Édipo-Rei é analisado sobre uma nova ótica, não para interpretar a psiquê humana, mas para demonstrar as formas jurídicas gregas vigentes na época em que foi escrito. O mito é dividido em três partes de duas metades, onde fica claro como o conhecimento seria interpretado com o tempo: primeiro ele era repassado pelos deuses (oráculo de Delfos e advinho Tirésias) que previam o futuro, depois os soberanos (Édipo e Jocasta) ditavam o que sabiam, e por último o povo (o pastor e o escravo) testemunhariam sobre fatos que haviam presenciado. Move-se o conhecimento de algo que ainda não ocorrera para algo que já aconteceu, da profecia para o testemunho, dos deuses para os reis e depois para o povo.

Terceira conferência - Na Idade Média, o soberano passa de um mero observador de procedimentos nas contendas particulares para representante da vítima. O procurador assume o papel da parte ofendida, a ofensa contra a moral passa a ser crime contra o Estado, e a reparação passa a ser exigida pelo rei. Os litígios privados tornam-se públicos. Surge o poder judiciário, para assegurar ao rei e à classe dominante a continuidade de seu domínio.

Quarta conferência - A reorganização nos séculos XVIII e XIX do sistema penal não seguiu as teorias dos pensadores da época, como Beccaria, Bertham e Brissot, mas adotou o que o sistema econômico indicava como mais lucrativo. Os mecanismos penais já não se importam mais com o fato criminoso, mas em controlar a conduta antes e após o delito. E esses mecanismos de controle passam a ser utilizados na indústria, educação, religião, etc.

Quinta conferência - O controle dos que estão no poder fica sobre a força produtiva do indivíduo. Ele submete seu tempo, sua vida, ao seu patrão. O dinheiro que ganha também é parcialmente controlado pelas caixas econômicas e planos de previdência obrigatórios. Controla-se assim também onde e quando deve-se gastar o seu dinheiro. O controle sobre o tempo, o dinheiro, a vida das massas é condicionado pelo controle do conhecimento.

Apesar de não concordar com todas as teses de Foucault - como a de que os políticos estão mais próximos da verdade que os filósofos, por exemplo - tenho de admitir que o que ele escreve é altamente estimulante a novas idéias e pontos-de-vista. Vale a pena ler mesmo que você não esteja na faculdade. Quem quiser ler um resumo mais extenso que fiz do livro, baixe ele em pdf clicando aqui.

leitura em: Março 2008
obra: A Verdade e as Formas Jurídicas, de Michel Foucault
edição: 7ª, Nau Ediora (2003), 158 pgs
preço: Compare no Buscapé
Excelente

Comentários

  1. Muito boa a resenha. O "Vigiar e punir" realmente é amplamente usado nos cursos de direito, foi lá que o conheci, assim como seu autor. Abraços.

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  2. Excelente resenha, mas gostaria de observar que a palavra profeCia não se escreve com dois "SS" como está na linha 6 (penúltima) do comentário da segunda conferência.
    Atenciosamente.

    Ubirajara

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  3. Muito obrigado pela dica, Ubirajara. A falha já foi corrigida.

    1 abraço.

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  4. OiJLM, Como faço para copiar esta resenha do livro A Verdade e as Formas Jurídicas, de Foucault, respeitando sua autoria. Preciso ler o livro e sua resenha está bem clara , vai me ajudar e servir de roteiro para ler o livro. Obrigada, Simone

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  5. Já consegui, fui lá no seu site e aproveitei para adicioná-lo aos meus favoritos, virei pesquisar outras vezes, seu texto me ajudou a entender as entrevistas com Michael Foucault,pois estou fazendo pós graduação em psicologia Jurídica . Obrigada, Simone

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  6. Fernanda Queiroz19/11/2011, 09:52

    Gostaria de ter acesso ao seu resumo mais extenso sobre esse texto de Foucault. Como posso conseguir? Obrigada.

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