Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, de Marçal Aquino
"O amor é sexualmente transmissível"
Um livro que aborda vários aspectos diferentes dentro de si, conseguindo agradar a gregos e goianos, não deve ser menosprezado. Como definir em poucas palavras uma obra tão multifacetada? Ora, com poucas palavras multifacetadas! Bem, nesse aspecto, Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, de Marçal Aquino, é um romance, mas é também uma crítica à polícia, religião e sociedade, e uma teoria sobre os males do amor, e uma grande crônica juntando tudo o acima. O livro traz histórias ordinárias, comuns - que vemos acontecer por aí todos os dias - mas com alguns desfechos carregados na tragédia - também vistos vez por outra. Aí é que está a grande arte de Aquino: ele conquista vários tipos de leitor que, com alguma das facetas do livro ou com alguma das situações vividas pelos personagens, se identificam na estória. Uma identificação sutil, todavia imediata e intensa.
Dentre os personagens não há nenhum super-herói, pelo contrário, estão carregados de defeitos e pecados: há o japonês agiota e pedófilo, o fotógrafo sem maiores objetivos, o careca que sofreu por toda a vida um amor platônico, a ex-prostituta meio louca, mas sensual ao extremo, o pastor que quer salvar até a última ovelha, o jornalista assexuado que prefere livros à pessoas, etc etc etc. São personagens que, apesar de imperfeitos, mostram defeitos que a maioria possui, vez por outra, em maior ou menor grau. Quem já não sofreu por amar alguém proibido(a)? Quem já não fez loucuras de amor sem pensar nas conseqüências? Quem já não viu o lado bom e o mau da mesma pessoa alternando-se sucessivamente? Quem não ficou disposto a enfrentar no tapa o mundo todo pela pessoa amada, e quem não receberia até as piores notícias vindas do lindos lábios dela?
O protagonista da trama é Cauby, um fotógrafo de 40 anos que vai parar numa cidade no interior do Pará e acaba envolvendo-se com Lavínia, 24 anos, uma mulher sedutora, misteriosa, lunática e... casada. Há ainda lugares no interior do país em que a honra se lava com sangue. Mas, que fazer quando se cai no meio de um redemoinho, ou pior, no centro de um furacão? Como escolher conscientemente entre o que é certo, o que se deseja e o que é melhor?
Um dos pontos altos do livro é a não linearidade da estória. Em um parágrafo aparecem dois homens conversando na varanda de um hotel. No seguinte são as lembranças de um deles. No próximo, é a narração do passado do outro. Sem divisões visíveis. Essa é uma técnica que, quando bem utilizada, torna o desenvolvimento mais interessante além de estimular o raciocínio do leitor. No cinema, vem sendo usada para quebras entre realidade e imaginação, como nos recentes Cashback e Sex and Death 101. Na literatura, foi bem dosada em Os coxos dançam sozinhos, de Mário Prata, e extrapolada em O Jardim do Diabo, de Luis Fernando Verissimo, onde dois tempos distintos confundem-se no mesmo parágrafo, na mesma frase, ocasionando - intencionalmente - divertidas confusões. Como é uma técnica que poucos sabem usar, quando encontramos um escritor que saiba, a leitura geralmente compensa.
Outro ponto a favor do livro são as citações obscuras do filósofo-psicólogo do amor, Benjamin Schianberg (mais um dos personagens fictícios introduzido de uma forma bastante original), que são mencionadas na narração de Cauby em momentos oportunos. Integram-se de tal modo à trama que se tornam essenciais. É o professor Schianberg quem diz: "o segredo não é descobrir o que as pessoas escondem, e sim entender o que elas mostram" e "queremos o que não podemos ter, o que diferencia uma pessoa de outra é quanto cada uma quer o que não pode ter" e "há sempre um pouco de loucura no amor, mas há sempre um pouco de razão na loucura". O interessante é que já há sites citando Schianberg como uma pessoa real. Agora só falta aparecer o livro dele nas bancas, O que vemos no mundo. Talvez seja uma ótima sugestão para testar Aquino como ghostwriter dele mesmo.
Marçal Aquino já foi jornalista, repórter e roteirista. Agora escreve livros de sucesso como O amor e outros objetos pontiagudos (ganhador do Prêmio Jabuti em 2000) e O invasor (que virou filme roteirizado pelo próprio Aquino). Ler Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios dá uma vontade imensa de conhecer os outros trabalhos do autor. E já faz parte da literatura brasileira contemporânea altamente recomendada para os amantes da boa leitura.
leitura em: Janeiro 2008
obra: Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, de Marçal Aquino
edição: 1ª, Companhia das Letras (2005), 229 pgs
preço: Compare os preços de Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios no BuscaPé
Um livro que aborda vários aspectos diferentes dentro de si, conseguindo agradar a gregos e goianos, não deve ser menosprezado. Como definir em poucas palavras uma obra tão multifacetada? Ora, com poucas palavras multifacetadas! Bem, nesse aspecto, Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, de Marçal Aquino, é um romance, mas é também uma crítica à polícia, religião e sociedade, e uma teoria sobre os males do amor, e uma grande crônica juntando tudo o acima. O livro traz histórias ordinárias, comuns - que vemos acontecer por aí todos os dias - mas com alguns desfechos carregados na tragédia - também vistos vez por outra. Aí é que está a grande arte de Aquino: ele conquista vários tipos de leitor que, com alguma das facetas do livro ou com alguma das situações vividas pelos personagens, se identificam na estória. Uma identificação sutil, todavia imediata e intensa.
Dentre os personagens não há nenhum super-herói, pelo contrário, estão carregados de defeitos e pecados: há o japonês agiota e pedófilo, o fotógrafo sem maiores objetivos, o careca que sofreu por toda a vida um amor platônico, a ex-prostituta meio louca, mas sensual ao extremo, o pastor que quer salvar até a última ovelha, o jornalista assexuado que prefere livros à pessoas, etc etc etc. São personagens que, apesar de imperfeitos, mostram defeitos que a maioria possui, vez por outra, em maior ou menor grau. Quem já não sofreu por amar alguém proibido(a)? Quem já não fez loucuras de amor sem pensar nas conseqüências? Quem já não viu o lado bom e o mau da mesma pessoa alternando-se sucessivamente? Quem não ficou disposto a enfrentar no tapa o mundo todo pela pessoa amada, e quem não receberia até as piores notícias vindas do lindos lábios dela?
O protagonista da trama é Cauby, um fotógrafo de 40 anos que vai parar numa cidade no interior do Pará e acaba envolvendo-se com Lavínia, 24 anos, uma mulher sedutora, misteriosa, lunática e... casada. Há ainda lugares no interior do país em que a honra se lava com sangue. Mas, que fazer quando se cai no meio de um redemoinho, ou pior, no centro de um furacão? Como escolher conscientemente entre o que é certo, o que se deseja e o que é melhor?
Um dos pontos altos do livro é a não linearidade da estória. Em um parágrafo aparecem dois homens conversando na varanda de um hotel. No seguinte são as lembranças de um deles. No próximo, é a narração do passado do outro. Sem divisões visíveis. Essa é uma técnica que, quando bem utilizada, torna o desenvolvimento mais interessante além de estimular o raciocínio do leitor. No cinema, vem sendo usada para quebras entre realidade e imaginação, como nos recentes Cashback e Sex and Death 101. Na literatura, foi bem dosada em Os coxos dançam sozinhos, de Mário Prata, e extrapolada em O Jardim do Diabo, de Luis Fernando Verissimo, onde dois tempos distintos confundem-se no mesmo parágrafo, na mesma frase, ocasionando - intencionalmente - divertidas confusões. Como é uma técnica que poucos sabem usar, quando encontramos um escritor que saiba, a leitura geralmente compensa.
Outro ponto a favor do livro são as citações obscuras do filósofo-psicólogo do amor, Benjamin Schianberg (mais um dos personagens fictícios introduzido de uma forma bastante original), que são mencionadas na narração de Cauby em momentos oportunos. Integram-se de tal modo à trama que se tornam essenciais. É o professor Schianberg quem diz: "o segredo não é descobrir o que as pessoas escondem, e sim entender o que elas mostram" e "queremos o que não podemos ter, o que diferencia uma pessoa de outra é quanto cada uma quer o que não pode ter" e "há sempre um pouco de loucura no amor, mas há sempre um pouco de razão na loucura". O interessante é que já há sites citando Schianberg como uma pessoa real. Agora só falta aparecer o livro dele nas bancas, O que vemos no mundo. Talvez seja uma ótima sugestão para testar Aquino como ghostwriter dele mesmo.
Marçal Aquino já foi jornalista, repórter e roteirista. Agora escreve livros de sucesso como O amor e outros objetos pontiagudos (ganhador do Prêmio Jabuti em 2000) e O invasor (que virou filme roteirizado pelo próprio Aquino). Ler Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios dá uma vontade imensa de conhecer os outros trabalhos do autor. E já faz parte da literatura brasileira contemporânea altamente recomendada para os amantes da boa leitura.
"Falamos, falamos, falamos. E mesmo assim faltou dizer tanta coisa. E escutar também. Ela nunca disse que me amava. Jamais ouvi de seus lindos lábios a sentença que pronunciei algumas vezes."
leitura em: Janeiro 2008
obra: Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios, de Marçal Aquino
edição: 1ª, Companhia das Letras (2005), 229 pgs
preço: Compare os preços de Eu receberia as piores notícias dos seus lindos lábios no BuscaPé
eis aí um livro que pelo título só em si eu não leria, mas lendo a resenha mostra-se interessante.
ResponderExcluirAdorei esse livro, encontrei seu blog por acaso!
ResponderExcluirEstava procurando por esse livro para fazer uma resenha no meu blogue "Um livro por semana" (http://umlivroporsemana.com) quando encontrei a tua, mais completa e profunda.
ResponderExcluirJá virei fã.
abraços
Ok, me convenceu a ler ;-)
ResponderExcluirgostaria de saber se tem o livro disponivel para download na internet, na minha cidade não tem e ficaria caro demais encomendar. Aguardo resposta. Obrigada
ResponderExcluirñ sei te dizer, nayara.
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