Efeito indesejado

Alguma coisa estava errada. Eu já tinha usado todo o meu suprimento semanal e não conseguia sentir nada. Nem êxtase, nem euforia, excitação, ansiedade ou amortecimento. Nada. Primeiro pensei que tivesse sido enganado: o fornecedor me vendera alguma porcaria falsificada. Mas quando notei a namorada e os amigos deleitando-se pela sala da mesma remessa que eu havia usado, percebi que o problema era comigo. Daí, pensei que talvez eu tivesse criado alguma defesa natural contra os efeitos. Era isso. O meu corpo acostumara-se ao uso contínuo e excessivo e como vingança resolveu não me proporcionar mais o prazer viciante. Eu estava fadado a ser um usuário insensível e ter que suportar todos se divertindo ao meu redor enquanto eu seria apenas um mero expectador. Por fim, pensei que todos ali poderiam estar fingindo, como na fábula da roupa nova do imperador, eles também não estavam sentindo nada, assim como eu, mas não confessavam para não parecerem estranhos e diferentes ao grupo. Neste caso, eu poderia fingir também, mas que graça teria? Levantei de supetão, coloquei as sobras em uma sacola e saí. Vou comprar mais, talvez me ajude. Entrei na Pharmacia, chamei o boticário e pedi outra dezena de Coca-Cola’s. Sim, eu havia levado as garrafas vazias.

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